23/08/2021

Panela velha é que faz comida boa...

 

Crédito da imagem: Jaya Richardson (https://jayarichardson.com/review-pentax-m-200mm)

Aí você acha em um site de venda de equipamentos usados uma lente SMC Pentax MC 200mm f/4 anunciada como "apenas para decoração" e investe R$ 50,00 na compra. O frete me custou R$ 37,00. quase o valor da lente. O comprador, muito honesto, ainda avisa no anúncio que a lente tem fungos. Pelo preço e pela lente resolvo arriscar. Quando a lente chegou a parte cosmética estava boa - dado a idade da mesma - apesar de seus quarenta anos bem vividos na mão de um ou mais fotógrafos. Todos os elementos tinham fungos moderados. O anel de foco meio pesado. mas o que estava muito ruim mesmo era o elemento trazeiro. Além do mofo tinha haze (opacidade) causado pelo descolamento da resina que une as duas lentes do grupo trazeiro. Tirei uma foto e apezar do foco estar cravado, a imagem estava muito "soft", sem contraste e com um tom amarelado. Realmente... do jeito que estava serviria como um bom peso de papel em minha mesa. Mas resolvir levar a "paciente" para a UTI.

A lente foi toda desmontada e os vidros mergulhados em peróxido de hidrogênio (sim... a boa e velha água oxigenada) por algumas horas. Depois um enchague e limpeza final com acetona. ficararam novas. Mas o elemento trazeiro precisava ser descolado, limpo e colado novamente com resina natural. Acontece que as lentes fabricadas até os anos 80/90 eram coladas com Bálsamo do Canadá - uma resina extraída de uma árvore da família dos pinheiros, comum no norte dos EUA e Canadá. Depois de quinze minutos no forno da cozinha, onde a namorada assava uma carne, os dois elementos se separaram. Metade da resina ficou em uma parte e a outra metade na outra.
 

A resina, que já estava ligeiramente amarelada e opaca, ficou mais escura devido ao calor de 190º C do forno. Depois de uma boa limpeza com acetona, e muita paciência, ficaram totalmente livres da cola e com a transparência original. Agora chegava a hora de colar as duas partes novamente. Operação delicada, pois se os dois elementos não ficarem totalmente alinhados, alente inteira perderia o foco e ficaria cheia de aberrações cromáticas. Apesar de ser bem difícil de achar hoje em dia, consegui comprar o bálsamo natural em uma fábrica de produtos químicos para laboratórios de análises químicas. Depois de algumas horas sossegadas em um cantinho a cola secou. O excesso de cola nas laterais foi retirado e as lentes foram limpas novamente com acetona. O resultado ficou muito bom. E o coating não foi alterado. Na foto abaixo pode se observar a difração da luz que passa através dos elementos e da camada de resina, como dois quadrados coloridos. A transparencia ficou perfeita. Adeus haze!


Depois da lente montada e lubrificada era o momento do teste de imagem e qualidade. E aqui é que minha paixão por lentes antigas totalmente manuais e sem eletrônica embarcada se justifica. Apesar de ser uma lente fabricada nos anos oitenta para câmeras SLR de filme, a qualidade ótica se rivaliza com as similares atuais. Sendo que as lentes modernas - por conta de oferecerem recursos de foco e abertura automáticos - tem muitos componentes eletrônicos e eletromecânicos, como motores, placas de circuito, processadores e os danados dos cabos flat que teimam em partir na pior hora. As lentes vintage são objetos óticos puramente mecânicos. Não eram usadas partes plásticas, principalmente no corpo. São robustas e se tratadas com carinho durarão séculos. 


Na imagem acima o famoso teste da caixa de cereais. A imagem está como saiu da câmera (Pentax K5) sem retoques. A abertura não é a menor que a lente oferece (f/4). Em f/5.6 para ambientes internos ela oferece a melhor nitidez. Mas em fotos em ambientes externos com muita luz incidente é melhor fechar a iris para f/8, onde se consegue a melhor nitidez e quase nenhuma aberração cromática. Na foto abaixo a mesma caixa fotografada com uma lente mais nova, já com recursos de foco e abertura automáticos e zoom variável de 70-210mm. Usei as mesmas configurações de velocidade e ISO nas duas fotos.


A diferença na luminosidade foi por conta do intervalo entre as duas fotos, tiradas perto de uma janela com a tarde caindo. Como eu disse, optei por não corrigir as imagens para um resultado mais fidedigno. Eu diria que se existe diferença de nitidez entre as duas lentes, é muito difícil de perceber observando as fotografias no Photoshop sem aumentar o zoom para mais de 100%. Mas convenhamos... entre pagar cerca de R$ 400 por uma cópia usada em bom estado e mais de R$ 3.000,00 por uma lente mais moderna (usada em bom estado) com as mesmas características, não precisa pensar muito. 

O problema é que os fotógrafos mais novos e mesmo nós da geração mais antiga, acostumamos com a facilidade do autofoco e abertura automática das lentes modernas. Temos pressa para tudo. Até mesmo para perder uma tempo antes do click (quando a situação permite) para pensar na foto, observar a cena e regular a máquina toda no modo manual. Eaí perdemos uma parte do charme, do prazer e do mistério da fotografia. 

2 comentários:

  1. Fala amigo. Estou com uma Pentax.50mm 1.7 Desmontei ela e me deparei com o elemento traseiro colado. Vc colocou ela no forno e ela descolou? E depois apenas aplicou a cola de forma simples?

    Se puder me ajudar, adoro essa lente e queria ressuscitar ela.

    aumirck@hotmail.com @almirninja

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    1. Ola. Forno não adianta e ainda arrisca a quebrar a lente por mudança subta de tempeatura ao abrir a porta. O melhor é "ferver" a lente em óleo vegetal com ela toda imersa nesse óleo em uma panela pequena. Aos poucos ela vai descolar. Para colar se usa bálsamo do canada e tem uns macetes pra evitar bolhas e diferença na espessura do conjunto.

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Marcelo Ruiz

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