09/08/2021

Mofo, haze, poeira e falta de cuidado: c

 


Vejo muitos fotógrafos vendendo lentes muito boas, por preços incompatíveis, por conta de arranhões, fungos, poeira ou haze nos vidros. A questão não é tão simples. Uns pedem um valor muito abaixo do que a lente vale, pois pensam que uma lente com fungo ou haze está perdida. Outros pedem um valor alto que dificulta a venda, pois o risco para quem compra e tem que providenciar a limpeza é alto. Em muitos casos a presença de um pouco de poeira, fungo, haze moderado ou mesmo arranhões no vidro frontal não atrapalham a qualidade da imagem. Incomodam mais o dono da lente pela questão estética. E na maioria dos casos fazem a lente, muitas vezes, muito valorizada, perder preço na hora da revenda.

Restauro de lentes não é algo fácil, barato ou disponível com facilidade. O custo de um bom trabalho depende muito do tipo de problema e o modelo da lente. Alguns defeitos (haze ou fungos muito agressivos) podem não ter reparo ou, mesmo depois de sanados, não deixarem a lente perfeita como veio de fábrica. Na foto abaixo, mostro um exemplo de lente que recebi para limpeza. Trata-se de uma lente Pentax 18-55 WR (que geralmente vem no kit das câmeras Pentax) e apresentava um pouco de fungo no elemento frontal e um haze acentuado na lente traseira. Nesse caso, o resultado ficou satisfatório. Foi feita a separação do elemento traseiro, limpeza e recolagem com resina apropriada. O elemento frontal só precisou de limpeza.


Lentes modernas são geralmente mais difíceis de recuperar. Os elementos óticos, que compõe os grupos de lentes, como os acromáticos (sanduiche de 2 ou 3 lentes coladas), são unidos com colas sintéticas, geralmente curadas com luz ultravioleta.
 Difíceis e arriscadas de separar. As da era analógica são coladas com uma resina vegetal natural e mais fáceis de serem descoladas, limpas e recoladas com a mesma resina. Há ainda o problema da parte eletrônica. A desmontagem das placas de circuito unidas por cabos flexíveis é uma tarefa bem delicada. Muitos desses flats já estão prestes a se romperem e são difíceis de serem trocados.

Por isso gosto muito das lentes antigas, totalmente mecânicas. Qualidade dos vidros, construção sólida, geralmente em metal, sem eletrônica embarcada ou se houver, como no caso das lentes fabricadas no final da era analógica (fim dos anos 2000), com poucos componentes. Essas lentes são verdadeiros tanques de guerra. Muitas com mais de 40 anos ainda funcionam perfeitamente, se foram bem cuidadas. E se não foram, a restauração é mais simples. Cada uma tem sua característica em termos de desfoque de fundo (bokeh), renderização de cores e características de foco. Usadas com adaptadores nas modernas câmeras digitais dão às imagens captadas uma assinatura especial. Mas requerem perícia e muita experimentação para darem o seu melhor. E nunca vão deixar o fotógrafo na mão por defeitos eletrônicos.

Defeitos mais comuns em lentes antigas ou novas

Poeira, partículas ou manchas:

Tanto podem ser externas quanto internas. As manchas de gordura geralmente estão nos vidros externos. Causadas por dedos que encostam na lente, poluição atmosférica, exposição aos elementos do tempo. São fáceis de serem removidas. Um pano macio de microfibra geralmente resolve o problema. Se preciso, um bom líquido de limpeza resolve os casos mais difíceis. Geralmente todo bom fotografo tem seu kit na bolsa de câmeras.

A poeira interna, assim como pequenas partículas e manchas na parte interna das lentes aparecem com o tempo. São mais frequentes em lentes zoom pelo efeito de fole que a extensão e recolhimento dos tubos do barril causam. Aspirando poeira e partículas externas que se depositam nos vidros. As lentes seladas (resistentes à umidade ou gotículas de água) estão mais protegidas. Algumas partículas sólidas podem ser resultantes de micro pedaços de plástico ou metal que se desprendem dos mecanismos internos, como anéis de foco, helicoides e mecanismo de abertura. Ou mesmo pedaços de graxa solidificada com o tempo.

Esse tipo de sujeira já requer a manutenção técnica da lente, pois a mesma precisa ser aberta e muitas vezes desmontada inteiramente, para o técnico ter acesso aos grupos de lentes intermediários e ao diafragma. Se a manutenção deixa de ser feita, com o tempo essas partículas podem agredir de forma permanente a superfície dos vidros e mesmo travar os delicados sistemas mecânicos e eletrônicos da objetiva.

Mofo:

O temível mofo! Uma coisa é quase certa: um dia ele vai aparecer na sua lente. Muito comum nas lentes mais antigas, por conta do tempo que muitas passaram em ambientes inadequados e sem manutenção preventiva, podem aparecer em lentes novas. Quase sempre a causa é a umidade. Por isso lentes deveriam ser guardadas sempre em locais secos. Caixas estanques com um bom produto controlador de umidade dentro. O mofo é um agente biológico. Um ser vivo.

Restos de mofo causado por fungos que já morreram
São os fungos que estão por toda parte. Até em nosso corpo. O padrão característico de mofo que vemos nas lentes – aqueles desenhos em forma de micro galhos de árvore ou parecendo com rios e seus afluentes – é resultado do caminho que o fungo fez na lente, antes de morrer, “se alimentando”, geralmente, do revestimento (multi coating) antirreflexos ou de correção cromática a que as lentes são submetidas no processo de fabricação. Em casos severos, sem a devida manutenção, acabam por destruir parte desse revestimento. Ou seja: ainda pode ser eliminado, mas as cicatrizes no vidro permanecerão, a menos que seja feito um polimento dos mesmos. No processo o revestimento será totalmente eliminado, sujeito a lente a anomalias quanto a flair ou aberrações cromáticas.

Esporos de mofo (circulares) ainda ativos (vivos)
Os pontos brancos bem localizados podem ser indício de uma infestação recente por fungos ainda vivos (ativos). Como se fossem culturas em uma placa de petri usada em laboratórios de biologia. Caso não sejam eliminados, com o tempo formarão o padrão descrito anteriormente. O processo de limpeza e eliminação de fungos e seus resíduos é um processo químico-mecânico, onde são usados agentes de limpeza como ácidos ou solventes. E também exigem a desmontagem total ou parcial da lente. O padrão de pontos encontrados nas lentes também pode ser causado por haze.

Haze:

Muitas vezes confundidos com mofo o haze tem vários padrões e várias causas. É um problema químico ou mecânico. Quando aparece na superfície interna de elementos individuais ou de conjuntos de lentes coladas, geralmente são causados por um agente químico que ataca a superfície do vidro ou o revestimento. Pode ser causado, por exemplo, por micro gotas de óleo ou graxa usada na lubrificação dos mecanismos internos ou das lâminas do diafragma. Eles são lançados na superfície dos vidros e atacam os mesmos causando danos físicos. Normalmente só desaparecem depois de um polimento fino das superfícies com abrasivos especiais. Nesses casos também o revestimento, se houver, será eliminado. É o defeito mais difícil e delicado de se recuperar.

Da esquerda para a direita: haze causado por contaminação do adesivo, haze causado por depósito de óleo na superfície interna e haze causado por descolamento da resina (padrão de arco-íris nas bordas).
Quando o haze aparece na parte interior de alguns elementos, um par de lentes coladas, por exemplo, geralmente é causado por danos mecânicos como quedas, que causam o descolamento desses elementos. Ou mesmo pelo envelhecimento da resina ou cola usada durante o processo de fabricação. A limpeza inadequada com solventes não apropriados, durante o processo de retirada de mofo ou partículas, podem causar o dano. Nesse caso o solvente penetra entre as lentes e dissolve parcialmente a cola, sendo mais visível nas bordas.

O processo de recuperação é o mais delicado de todos, envolvendo o desmonte da lente, a descolagem dos elementos afetados, a limpeza do adesivo deteriorado e a nova colagem com produtos apropriados. Nem sempre se tem sucesso em fazer esse reparo. Inclusive alguns técnicos se recusam a fazê-lo pelo risco de perda permanente da lente. Se o processo de colagem não for perfeito, o conjunto ficará desalinhada, causando aberrações na imagem e no foco. Ou mesmo perda da transparência original do vidro.

À esquerda: lente composta por dois elementos já separados e limpos. À direita: elementos em processo de colagem com resina vegetal.  
Portanto é muito melhor cuidar bem de nossas lentes do que remediar depois. De qualquer forma, antes de encostar uma lente boa ou preferida ou mesmo vende-la por valor irrisório é sempre bom consultar o valor do reparo com um profissional de confiança. Mesmo em casos de lentes com os vidros perfeitos, mas que deixaram de funcionar por problemas mecânicos ou eletrônicos. Na maioria dos casos o reparo, mesmo sendo caro (quando o serviço é bem feito) ainda será mais barato do que perder uma lente boa e muitas vezes rara.

Se o preço do reparo não compensar ainda restará a opção de guardar a lente para a coleção, usar as peças boas em outra lente igual ou vende-la por valor justo, sempre informando ao comprador o valor aproximado do reparo e se o mesmo é possível.  Boas lentes são o acervo mais valioso dos fotógrafos. Corpos de câmera, na era digital, sempre terão vida útil mais curta e se tornaram quase descartáveis. Mas algumas lentes são verdadeiras joias que devem ser preservadas e guardadas com carinho. E usadas em ocasiões especiais.  


2 comentários:

  1. Olá, Marcelo Ruiz.
    Que bom ver você voltando a fazer postagem aqui!
    Continue alimentando este espaço com o seu conhecimento.
    Obrigado.

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Obrigado por sua participação! Asim que eu puder, vou responder! Volte sempre!

Marcelo Ruiz

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