No segmento profissional ou
dedicado aos entusiastas sérios de fotografia, não houve danos consideráveis.
Mas pode se dizer que vem havendo uma influência cada vez maior em produtos
mais leves e com menor tamanho. E com recursos de edição na própria câmera,
geolocalização e distribuição de conteúdo via redes de dados diretamente para a
web. São tendências já estabelecidas porque se encontram disponíveis nos
telefones celulares muito antes de aparecerem nas câmeras fotográficas. Essa pressão
tem levado ao desenvolvimento avançado de câmeras mirrorless (ou Mirrorless Interchangeable-lens Camera - MILC), que
estão ganhando cada vez mais mercado. Essa tecnologia também é conhecida pela
sigla DSLM (Digital Single Lens Mirrorless), nomenclatura que será usada neste
artigo no lugar da palavra mirroless.
O futuro será DSLM ?
As grandes marcas não tem se importado em perder uma fatia de vendas de seu portfólio de DSLR´s, para seus próprios modelos de câmeras sem visor pentaprismático e espelho móvel, exatamente pela economia de peso, menores dimensões e maior simplicidade de fabricação. A Sony foi pioneira em lançar a primeira câmera full frame sem espelho e atualmente seus modelos A7 III e A9 estão no topo da gama de modelos. A Canon com sua nova full frame EOS R e a Nikon com a linha Z (Z6 e Z7). A Panasonic conta com suas novas Lumix S1 e S1R. A característica principal entre todos os modelos sem o espelho móvel e o pentaprisma é a menor distância entre o flange da lente e o sensor de imagem, resultando em corpos mais finos e leves.
Mais que o tamanho e a eliminação de uma boa parte de peças móveis dentro desse tipo de câmera, o barulho característico das DSLR também está com os dias contados. Embora pareça um detalhe irrelevante, muitos usuários vão gostar disso. E para dar mais peso a esse novo segmento, recentemente uma das maiores agências de notícias do mundo, a Associated Press (AP) anunciou uma parceria exclusiva com a Sony. De agora em diante a fabricante japonesa de câmeras será a única fornecedora de câmeras para os fotógrafos da casa. Conforme declarou David Ake, diretor de fotografia da AP, “o que me deixou realmente excitado sobre essa mudança para câmeras mirroless é que agora poderemos trabalhar de forma silenciosa (...) sem aquele som chato do espelho e do obturador atrapalhando a cena”.
Polêmicas à parte, pois eu
pessoalmente gosto muito do som característico das câmeras fotográficas SLR,
digitais ou analógicas, o fato é que para alguns fabricantes haverá, a partir
de agora, essa divisão clara em suas linhas de produção. E embora exista a
especulação sobre um futuro desaparecimento das DSLR (e a tecnologia do espelho
móvel e visores óticos) os fabricantes não dão sinais que abandonarão o método.
Muitos especialistas acreditam que esses modelos jamais deixarão de existir.
Assim como as antigas SLR (câmeras com o mesmo princípio de funcionamento, mas
que ainda usam filmes fotográficos) estão ensaiando a volta ao mercado. Na
verdade nunca saíram, pois muitos fotógrafos ainda conservam cuidadosamente e
usam seus modelos anteriores às digitais, fazendo os preços de algumas marcas
icônicas usadas subirem ao ponto de se igualarem a algumas de suas primas
digitais. A Kodak dobrou sua produção e venda de filmes fotográficos nos
últimos cinco anos.
O fim das câmeras DSLR?
Analistas de mercado experientes
na área de imagem e vídeo apostam que o mercado de câmeras digitais continuará
em retração por mais uma década e poderá até desaparecer. Mas nenhum deles aposta
todas as suas fichas nessa última hipótese. Muitos acham que o mercado vai se
concentrar em nichos e que por muitas décadas ainda haverá fotógrafos que não
abrirão mão das câmeras convencionais. Com certeza grande parte desse mercado
será concentrado, nos próximos anos, nas câmeras voltadas ao mercado
profissional, mas dentro da tecnologia DSLM (sem espelho). Como escrevi mais acima, a Associated Press (AP),
que detém grande influência no mercado jornalístico, está influenciando essa
mudança ao migrar para esse tipo de tecnologia.
As razões dessa mudança não são
apenas mera discussão técnica das vantagens ou superioridade de um ou outro
formato. As vendas globais de câmeras despencam desde 2010. De acordo com a CIPA (Camera and Imaging
Products Association), as vendas de câmeras digitais atingiu o pico naquele
ano, com mais de 121 milhões de unidades vendidas. Em 2019 as vendas encolheram
para cerca de 15 milhões de unidades. Com a pandemia o mercado se contraiu
ainda mais. E para o ano de 2021 a previsão é que pouco mais de nove milhões de
unidades. Dessa forma, todos os fabricantes estão fechando seus balanços
fiscais com prejuízos bilionários na área de câmeras fotográficas e vídeo. A Olympus,
com mais de 84 anos de mercado anunciou em 2020 que estava se retirando do segmento
de imagem e vídeo, passando sua participação para investidores privados. E certamente
esses investidores farão mudanças nas estratégias de desenvolvimento de
produtos e tecnologias. A Samsung já havia feito o mesmo em 2017, encerrando a
produção e vendas dos modelos NX.
O mercado encolheu...
A Nikon, outrora um dos maiores
fabricantes de câmeras do mundo, também está diminuindo seus investimentos na
área, fechando várias unidades de produção de câmeras e lentes no Japão. A
Canon, que detêm 45% do mercado global no segmento de câmeras, também tem
reposicionado seu foco de desenvolvimento de produtos. O restante das vendas está distribuído entre a
Sony (com 20%), Nikon (19%), Fujifilm e Panasonic com 4,5% cada uma e os restantes
6% divididos entre vários fabricantes como a Ricoh/Pentax, Leica e outros. Se
nos mercados maduros (com facilidades de revendedores oficiais, assistência
técnica acessível e menos burocracia e impostos de importação) a Pentax tem uma
diminuta parcela desse mercado, aqui no Brasil a marca é praticamente
desconhecida. Como no resto do mundo, a Canon também detém a preferência dos
consumidores profissionais e amadores sérios. Provavelmente, em seguida estão
as outras marcas, com porcentagens de venda semelhantes ao mercado global. Essa
preferência se dá pela relativa facilidade do consumidor encontrar pontos de
venda e de assistência técnica de determinadas marcas. Embora as reclamações
quanto à qualidade, preço de serviços e peças seja comum a todos os demais
fabricantes.
Cada um no seu quadrado...
E falando em nichos de mercado, pelo
menos, no que depender de um fabricante tradicional e de peso nesse mercado, o
futuro das DSLR está garantido. A secular Pentax, fundada em 1919 no Japão (marca
agora pertencente à Ricoh Imaging Company Ltd.) tem declarado publicamente não
ter interesse em aderir ao segmento DSLM.
E realmente não tem motivos para isso. Mesmo havendo mudado de mãos, a empresa
continua desfrutando da fama que angariou nesses cem anos de existência. Muitos
adeptos da marca hoje são jovens que herdaram câmeras e lentes analógicas de
seus pais ou avós. E que herança! Principalmente se for um modelo LX 2000 Edição
Limitada, comemorativa do 75º aniversário da marca, que chega valer U$ 4 mil
dólares para colecionadores ou o dobro do valor de uma Pentax Fullframe K1-II
Silver Edition com produção limitada a cem unidades!
Embora também esteja passando por
dificuldades com as vendas e abrindo capital para investidores mais agressivos,
a empresa vem apostando na reputação de seus produtos e na produção limitada de
poucos modelos no segmento DSLR com sensores APS-C e Full Frame. Com isso tem
podido inovar em tecnologia e funcionalidades. Algo que a marca já faz a muitas
décadas. Uma das características que talvez mais agrade aos seus consumidores
fiéis é o fato da Pentax usar a mesma montagem de lentes (com baioneta K) desde
meados da década de 1970. Antes disso a empresa usou a montagem de rosca M-42
(que acabou ficando conhecida como montagem de rosca Pentax) por várias décadas,
o que assegurava o uso de outros fabricantes de lentes M-42. Ainda hoje, lentes
vintage M-42 são apreciadas por vários fotógrafos e usadas com adaptadores em
diversos modelos de câmeras digitais pela versatilidade e quantidade de modelos
e marcas disponíveis a um preço bem atraente.
A versatilidade da Pentax...
A baioneta Pentax K (também
conhecida como PK-mount) surgiu em 1975 nas Pentax SLR K2, KX e KM. Varias
implementações dessa montagem foram surgindo nos anos seguintes. Atualmente a
versão KAF2 equipa os
modelos com sensor APS-C e Full Frame. Apesar de diversas funcionalidades de
conexão eletrônica entre as lentes e o corpo das câmeras terem sido
acrescentadas ao longo dos anos, as dimensões físicas não mudaram. Isso permite
que todas as lentes analógicas ou digitais produzidas pela marca e por outros
fabricantes, com a montagem PK, possam ser utilizadas em qualquer DSLR Pentax. Essa
versatilidade fez com que diversos outros fabricantes de câmeras e lentes
adotassem o padrão PK Mount. São cerca de vinte marcas de câmeras e mais de
setenta fabricantes de lentes usando o sistema. Se houvesse uma iniciativa
conjunta de padronizar sistemas de câmeras/lentes, entre vários fabricantes - como
foi o caso do sistema Micro 4/3 desenvolvido em conjunto pela Panasonic e
Olympus em 2008 – a baioneta K da Pentax poderia ser a melhor candidata a essa
unificação.
Consumidores mais focados e fidelizados...
Quando se tenta prever o futuro
da fotografia e os rumos que o mercado de equipamentos tomará, é preciso
apreciar tudo com uma boa dose de precaução. Nenhuma tecnologia nova mata
completamente a anterior. O cinema não matou o teatro e nem o circo. O rádio
não substituiu os jornais impressos. A televisão, o videocassete, o DVD, o
Youtube e a Netflix não tornou obsoletos a Tv e o rádio, assim como o CD, o streaming
de músicas e as lives não acabaram com os LP´s e os grandes espetáculos ao
vivo. E os livros digitais jamais conseguirão extinguir as publicações em
papel. Entre todas essas tecnologias audiovisuais que surgem com promessas revolucionárias,
há um fator comum. A cultura. E essa é transmitida entre gerações moldando
gostos pessoais e tendências.
Quando muito conseguem criar
novas possibilidades e modismos, que podem ser ou não passageiros. Nichos de
mercado surgem se solidificam ou desparecem. Vejo isso como um movimento
positivo e salutar. Mais opções de escolha para os usuários, geralmente
moldadas mais pela praticidade e agregação de funcionalidades que acabam
tornando certas tarefas mais simples e rápidas. Mas somente isso não determina
a substituição de uma pela outra. Na fotografia profissional, seja no
jornalismo televisivo ou impresso (seja em papel ou páginas na internet) o
celular se consolida como ferramenta de aquisição de imagens estáticas, vídeos
e áudio pela praticidade, economia de custos e rapidez de produção de
conteúdos. Para o cidadão comum ele também se torna ferramenta de distribuição
de conteúdo nas redes sociais. Mesmo os fotógrafos amadores sérios tem
preferido, pelo menos em alguma parte do tempo, deixar em casa suas câmeras e
lentes mais caras e pesadas, pela facilidade de ter no bolso um meio de captura
de cenas do cotidiano mais simples e discreto.
Tradições e gostos nunca morrem...
Com certeza aparelhos celulares cada vez mais avançados e especializados em fotografia e vídeo farão parte do arsenal desses usuários. Como consequência, o investimento em inovação das câmeras convencionais – que hoje já atingiram um nível de definição muito superior ao necessário, em termos da qualidade de imagem, requisitada pelas diversas finalidades de uso de mídia – deve migrar para celulares, tablets e notebooks. Entre os fabricantes que conseguirem sobreviver nesse mercado de câmeras DSLR ou DSLM em encolhimento, a tendência será focar em nichos orientados por características específicas, tradição de conceitos e admiração por determinadas marcas. Assim haverá os fotógrafos que ainda continuarão – ou mesmo retornarão – ao uso de filmes convencionais, os apreciadores das DSLR com seus visores prismáticos, os que tem preferencia pelas silenciosas e compactas DSLM sem espelho e com visores LCD ou OLED, os amantes da fotografia em preto e branco (com equipamentos com sensores que só captam tons de cinza) e por aí à diante. A pressão pela produção industrial não poluente e focada no reuso e sustentabilidade também dará o tom dessas essas mudanças. Afinal os bons produtos que restarem nesse mercado tenderão a seguir a tradição da excelência da ótica fotográfica, onde algumas câmeras e principalmente lentes com mais de 50 anos de existência ainda tem grande valor de mercado, não importando serem modelos usados ou novos, fabricados com fórmulas óticas consagradas pelo tempo.
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Marcelo Ruiz
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